sábado, 27 de abril de 2019

A Argentina desce ao abismo e assusta Bolsonaro

Se o leitor ou a leitora teve a oportunidade de ir à bela Buenos Aires, tempos atrás, e se acostumou ao câmbio de 2,5 pesos por real, vai entender o que digo com ua única informação: o nosso real, mesmo baqueado em dólar, está comprando, neste momento, quase que 12 pesos!
O país está entrando em colapso: em um ano, o risco país  mais que dobrou – de 400 para mais de 900 pontos –  e já ninguém acredita que, mesmo com o semicongelamento de preços, a inflação do ano fique abaixo de 50%. Isto por enquanto.
As agências que fazem seguro de risco já consideram que o país terá de decretar moratória – chamada no mercado de default –  quando estiver para vencer o crédito de emergência obtido junto ao FMI.
Para uma geração que se acostumou em ver nos argentinos o famoso Efeito Orloff – “Eu sou você, amanhã” – é algo apavorante.
As pesquisas mostram que Maurício Macri segue descendo ladeira abaixo. Até dezembro de 2017, quando fez a reforma da Previdência, o atual presidente andava pelos 65 de aprovação, três vezes mais do que tem hoje.
Cristina Kirchner, perseguida pelo Ministério Público e pelo Judiciário, só não foi presa porque seu mandato de senadora obriga, para isso, que o Senado o autorize por dois terços dos votos, blindagem com que, lamentavelmente, Lula não contou aqui.
Apesar disso, já há algum tempo figura, com vantagem crescente, como a favorita nas PASO, as eleições primárias dos argentinos, na votaçao presidencial e, nos últimos dias, também no segundo turno – a balotage –  que, entre eles ocorre quando o vencedor não tem 45% dos votos ou mais de 40% e uma diferença de 10% para o segundo colocado.
O vizinho de cima dos portenhos, portanto, parece que colocou as barbas de molho. Jair Bolsonaro, do nada, declarou que está preocupado com uma eventual eleição da ex-presidente, que – diz ele – traria uma “nova Venezuela” ao continente.
Dia 30, à tarde, para marcar o 1° de maio, estão previstas enormes manifestações contra a política econômica de Macri. Veremos se o Efeito Orloff ainda funciona dentroe de alguns meses.

Um líder não negocia nem por sua vida

É preciso ser um sujeito totalmente desprovido de humanidade para não sentir o drama latente no texto de Florestan Fernandes Jr. com Carla Jimenes, no El Pais, com o qual se inicia a reprodução da entrevista feita hoje com o ex-presidentre Lula em seu cárcere em Curitiba.
É preciso, ainda mais, ser completamente obtuso para não ver que este é um documento de nossa história, um capítulo de um martírio que cruzará o século e que nossos bisnetos e trinetos aprenderão na escola.
 É o Lula de sempre. Ele está igual. Quem esperava vê-lo envelhecido ou derrotado, se frustra. Ele tem fúria. E obsessão para provar sua inocência. “Não tem problema que eu fique aqui para o resto da vida. Quem não dorme bem é o Moro, Dallagnol e o juiz do TRF-4 [que confirmou sua condenação em segunda instância].”
Mas é também o ser humano que está submetido a perdas seguidas: a mulher Marisa Letícia, o irmão Vavá, o amigo de décadas Sigmaringa Seixas e, pior, o neto Arthur.
Lula está engasgado e sabe que esta entrevista é a oportunidade para falar depois de um ano silenciado pela prisão em abril de 2018. A conversa tem início e o ex-presidente ainda mantém um semblante sério. Mas uma pergunta quebra a rigidez. Quando é questionado sobre a morte do irmão Vavá, em janeiro deste ano, e o neto, Arthur Araújo Lula da Silva, de 7 anos, dois meses depois.  “Esses dois momentos foram os mais graves”, lembra ele, citando também a perda do ex-deputado Sigmaringa Seixas, morto no final do ano passado. “O Vavá é como se fosse um pai pra família toda. E a morte do meu neto foi uma coisa que efetivamente não, não, não… [pausa e chora]. Eu às vezes penso que seria tão mais fácil que eu tivesse morrido. Porque eu já vivi 73 anos, eu poderia morrer e deixar meu neto viver.”
Mas a garganta e os olhos marejados não lhe traem a cabeça:
“Sei muito bem qual lugar que a história me reserva. E sei também quem estará na lixeira.”  Lula critica o ex-juiz Sergio Moro, responsável pela sua condenação, a Operação Lava Jato, e o procurador Deltan Dallagnol. “Reafirmo minha inocência, comprovada em diversas ações”. O silêncio é absoluto, apesar da presença de delegados da Polícia Federal e de três oficiais armados, todos a serviço da PF, que está sob o guarda-chuva do Ministério da Justiça, conduzido por Sergio Moro.”
Florestan narra que o velho líder “não está feliz nem triste, nem tampouco envelhecido. Mas está diferente”.
Lula diz que há outros momentos que o deixam triste, com uma mágoa profunda. “Quando vejo essa gente que me condenou na televisão, sabendo que eles são mentirosos, sabendo que eles forjaram uma história, aquela história do powerpoint do Dallagnol, aquilo nem o bisneto dele vai acreditar naquilo. Esse messianismo ignorante, sabe? Então eu tenho muitos momentos de tristeza aqui. Mas o que me mantém vivo, e é isso que eles têm que saber, eu tenho um compromisso com este país, com este povo”.
Em instantes, o vídeo de um trecho da entrevista.

O Lula que precisam calar. Assista

Perdoe, Lula, pela comparação.
Mas dois dias depois de ouvir um presidente que é incapaz até de ler um texto, que vai pingando as palavras como um bode despeja o que comeu, ouvir a carga de emoção, de dignidade, de simplicidade, em sua fala na primeira entrevista depois de 13 meses de silêncio compulsório é, ao mesmo tempo, uma tristeza profunda, ainda que com esperança de que não sejamos, por anos a fio, o país da mediocridade estúpida.
Sabe, sua fala tem a natureza do que os gaúchos chamam de tronco “guarda-fogo”, que depois de uma madrugada de frio e de garoa, tem a brasa imortal dentro de si e vai acabar por nos aquecer na manhã mais fria e nevoenta.
Se alguém ainda não entendia porque é tão importante para esta gente manter Lula preso e calado, entenderá agora.
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ECONOMIA NAS PALAVRAS...

FALOUPOUCO

Para que servem os “factóides” de Bolsonaro?

Há algo mais que o ridículo nas atitudes de Jair Bolsonaro de criar o fato consumado e, depois, fazer o governo dizer que “não é bem isso”.
Primeiro, com o reajuste do diesel anunciado, anulado e, afinal, efetivado pela Petrobras.
Agora, com a declaração do Secretário de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz de que “não tem validade” a ordem do presidente de que fosse suspenso o filmete do Banco do Brasil do qual “não gostou”.
O primeiro traço do episódio, bem evidente, é o desejo de “por em seu lugar” os dirigentes de empresas e órgãos do governo: suas decisões serão grosseira e grotescamente desautorizadas pelo Presidente da República, quando não o agradarem ou não lhe forem convenientes.
É o “manda quem pode, obedece quem tem juízo”, a “enquadrada no tranco” que é, para Jair Bolsonaro, a forma de exercer a autoridade sobre aqueles que estão na administração pública ou na política.
O segundo é o de que a disputa entre os gestores militares do governo e os agentes do clã bolsonarista está instalada dentro da Secretaria de Governo, o ministério que, admnistativamente, gere as ações do Palácio do Planalto.
A ordem para retirar o comercial do ar, formalmente, foi feita pelo secretário de Publicidade e Promoção da Secom, Glen Valente, ex-diretor comercial do SBT, trazido para o governo na semana passada por Fábio Wajngarten, nomeado para a chefia da Secom por Carlos Bolsonaro,  com direito a elogios de Olavo de Carvalho, guru do bolsonarismo.
Carlos e Olavo, como é sabido, embora com calibre menor, atiram em Santos Cruz como fazem com o vice Hamílton Mourão.
É, portanto, evidente que a tal “Instrução Normativa” invocada como razão para a ordem de “última forma” no veto ao filmete do banco foi apenas o “gancho” achado por Santos Cruz para enfraquecer o adversário colocado goela abaixo em sua cadeia de comando.
General sabe dar tranco, tanto ou mais que ex-capitão.

sábado, 20 de abril de 2019

Sim, o lavajatismo quer o poder. Para destruir o Brasil, faltou dizer

Insuspeito de simpatias ideológicas pelo petismo, Demétrio Magnoli, na Folha de hoje, faz excelente análise daquilo que cada vez mais pessoas percebem, embora há tempos seja óbvio: que 0 “Governo Bolsonaro é só uma escala técnica na rota do Partido dos Procuradores”, uma organização ” que alastrou suas bases pelo Ministério Público, extravasou para setores da Polícia Federal e da Receita e se disseminou entre militares da reserva e políticos (tanto governistas como de oposição).
Hoje, o projeto de poder tem seu próprio candidato presidencial, que atende pelo nome de Sergio Moro, e seu veículo oficioso de mídia, que é o site censurado pelo ato ilegal do STF.
Magnoli acerta em cheio no diagnóstico, mas erra na etiologia deste mal, ao situar  – possívelmente por suas idiossincrasias com o PT – o surgimento de seus “sinais iniciais emergiram em maio de 2017, na “operação Joesley Batista” e no artigo de Rodrigo Janot que denunciava “o estado de putrefação de nosso sistema de representação política”(…) enunciava, então, nada menos que um objetivo estranho à missão judicial da Procuradoria: limpar a República, substituindo a elite política tradicional por uma outra, pura e casta”.
É evidente que o uso político de investigações – sobretudo pelo vazamento seletivo e pela transformação de acusações em provas com alto valor de barganha – vem de antes, muito antes e teve seu primeiro clímax na capa da Veja do “Eles sabiam de tudo” lançada como panfleto eleitoral na véspera da eleição presidencial de 2014.
Não funcionou ali, mas funcionou a seguir, abrindo caminho para que a escória da política, como cupins, transformasse em estrutura carcomida e frágil o Governo, ajudada pela errônea – embora, talvez, inevitável – atitude de Dilma Rousseff de achar que as ideias econômica neoliberais, se postas devidamente na coleira, sossegariam a matilha.
A questão, infelizmente, é que grande parte da direita brasileira – e mais ainda porque seus núcleos de elite precisam descer ao nível da selvageria política para obter base social – já não tem sequer um projeto de desenvolvimento associado, “liberal com tinturas sociais”  coo sugeria o pensamento de Norberto Bobbio, que Fernando Henrique Cardoso gostava de citar.
Só o ódio insano é capaz de produzir adesão à versão atual do neocolonialismo que, se quiséssemos fazer paralelos historicos, teríamos de situa no Brasil colonial de antes da vinda da família real: uma subnobreza cuja vassalagem e dependência da metrópole interditava qualquer ação de desenvolimento do que viria a ser esta nação.
E quem são os “ingleses” beneficiários disto é ocioso dizer.
Aí está a chave para que se possa compreender, sem ilusões, o que significa a aspiração “lavajatista” ao poder absoluto: o desejo de destruição do estado nacional cujas bases foram lançadas na  Revolução de 30. Não é apenas no (re)tornar a questão social a “um caso de polícia”. É tornar a política uma dança formal num baile onde só podem estar os convidados desta risível corte.
Aos demais, “cortem-lhe as cabeças”.

O caso STF: lições de uma arapuca

Ouvi e absorvi uma frase de Leonel Brizola que deveria servir de bússola a muita gente: na luta política, os métodos acabam por refletir antecipadamente os fins.
O episódio que distraiu o país de seus problemas reais, esta semana, transformando a censura a uma publicação de agentes provocadores – que, de tão repulsivos a mim são, que nem o nome lhes cito – é um destes casos em que, do princípio ao fim, mostram como o país está sujeito a uma deformação que só nos conduz à perda da liberdade.
O desvio original foi tomado lá atrás, quando se transferiu para Justiça a luta política, ao se enxergar no chamado “mensalão” a via para destruir a hegemonia da centro-esquerda: o que, pela via eleitoral, não se alcançava.
Sérgio Moro, como juiz-auxiliar no STF, foi cria deste processo. Mas o útero em que se formou foi tecido em 2010, pela então presidente da Associação de Jornais, Judith Brito, ao anunciar que a imprensa, dada a fraqueza do PSDB, seria “a verdadeira oposição”.
Muita coisa se passou nesta década e não é necessário historiá-la. Também não é preciso dizer que isso só alcançou o ponto a que chegamos porque uma conjuntura mundial, a partir da crise global de 2008/09, o ajudou.
O fato objetivo é que o foco dos desejos nacionais – a opinião que se publica, na definição genial do Barão de Itararé – foi mudado da posição “crescer e incluir” para a “punir e prender”.
Nossas mazelas, nosso subdesenvolvimento, carências e atrasos, desde o maldito “padrão Fifa”, passaram a ser imputados à corrupção, em lugar da dependência, do rentismo, da tutela do capital financeiro que passou, nos anos 80, a ser o “dono” da economia, interrompendo o desenvolvimento, ainda que precário, da indústria e da infraestrutura nacionais.
Para produzir o desmonte definitivo deste país, porém, era preciso mais: era necessário desmontar as estruturas político-partidárias que, mal ou bem, traduziam as expectativas de desenvolvimento, as quais precisavam ser inteiramente entregues à lenda de “o mercado nos salvará, se o deixarem livre”.
A “Lava Jato”, há cinco anos, cumpre magistralmente esta função. Avançou e ocupou todos os espaços; tranformou o Supremo em capacho do “movimento de moralização” – leia-o com duplo sentido, se quiser – do Brasil e foi impiedoso com qualquer tentativa que este fizesse de ainda preservar alguma independência. Teve aliados “internos” – Luiz Roberto Barroso, Edson Fachin e Cármem Lúcia -, teve um Luiz Fux sempre à mão e a tibieza de Rosa Weber, sempre a fazer virarem poeira suas convicções e se juntar ao grupo, com as mais variadas e frouxas razões.
Do outro lado, tinha Gilmar Mendes para fazer o papel de “diabo plausível” para chamar de “aliado de bandidos”, a falta de foco de Ricerdo Lewandowski e Marco Aurélio Mello e o sempre atemorizado Dias Toffoli. Celso de Mello, um conservador, era sempre dado como caso perdido, desde que mostrou que, no final da carreira, prezava mais a fama de juiz erudito que a de juiz herói.
Mas perdeu um voto que considerava certo, o de Alexandre de Moares que, pela extração consevadora e modos agressivos, era dado como “seu”. Quando o lavajatismo perdeu a votação para enviar à Justiça Eleitoral os casos de “Caixa-2”,  antecipou o ataque que preparava para quando assumisse o controle absoluto da Procuradoria Geral da Justiça, com a substituição de Raquel Dodge.
Disse absoluto, porque ela nunca teve condições de tirar a PGR do império de Curitiba onde Rodrigo Janot, por vaidade forte e caráter fraco, a lançou.
Como a Procuradoria estava impedida, por isto, de agir em seu papel de defender o Supremo da onda de fake news e de ameaças – quem se lembra do caso do sujeito que partiu para cima de Lewandowski num avião? – Toffoli mandou abrir o esdrúxulo inquerito para isso.
Era preciso evitar que a República de Curitiba aparecesse como maestrina desta ofensiva. E usou-se a máquina suja de que dispunha para expor Toffoli, com uma “acusação” vaga dentre muitas que recolheu no “negócio” – em todos os sentidos – que fechou com a Odebrecht  na delação que levou à soltura de Marcelo, numa orquestração que rendeu bônus e “salários” a oito dezenas de executivos da empresa.
Toffoli e Moraes morderam a isca e transformaram uma pequena imundície, vinda de fonte imunda, por vias igualmente imundas em comoção nacional.
Por mais que o recuo, ontem, possa, com o tempo, minimizar o prejuízo, Curitiba blindou-se.
Usou-se, contra ela, os métodos de atropelo da lei que ela sempre usou.


Delatores de encomenda. E a Justiça aceita

É só porque o Brasil se tornou o país do impensável que não se torna um escândalo a reportagem de Consuelo Diegues, hoje, na Piauí.
É o relato, detalhado e documentado, de como a CCR – empresa do grupo Andrade Gutierrez – compra e dirige as “delações premiadas” de seus executivos.
Os mais “baratos” vão ganhar R$ 78 mil reais por mês para dizer o que a empresa quer que seja dito sobre propinas e corrupção em suas ações.
E só o que ela quer, claro que com acordo com os membros do Ministério Público:
O contrato deixa claro que há limites sobre o que os delatores vão contar aos promotores. Destaca que “o colaborador, caso seja obrigado a divulgar Assuntos Confidenciais, compromete-se a fornecer apenas a parte que é legalmente exigida e a empreender todos os esforços razoáveis para obter garantias confiáveis de que o tratamento confidencial será dado a tais Assuntos Confidenciais”. Além disso, os delatores se comprometem a “não fazer declarações públicas a quaisquer terceiros, tais como veículos de mídia e impressa, investidores e analistas de mercado, bem como a quaisquer pessoas físicas ou jurídicas (…) que sejam prejudiciais à Companhia e às sociedades pertencentes ao grupo CCR ou à reputação de seus executivos e empregados”.
Do contrário, será suspenso o bônus de R$ 78 mil mensais, durante cinco anos, que os “arrependidos” farão jus.
A delação é contratualmente dirigida e fica explícito que será segundo que a empresa quer, em suas tratativas com o Ministério Público.
São confissões, verdadeiras ou falsas nisto ou naquilo,  que serão compradas a dinheiro vivo e com contrato assinado,  e isso é homologado  por um juiz.
Não é inédito, e foi feito com o pagamento de milhões de reais aos delatores da Odebrecht.
A corrupção tornou-se aceitável no Brasil desde que seja por contrato.
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Democracia é selvageria?

Quem é jornalista – e mais ainda quem se dedica a um jornalismo político de opinião – não pode ser, até por autoproteção, defensor da censura à liberdade de expressão.
Isso não pode se confundir, jamais, com agressões infundadas à honra e a dignidade de pessoas, muito menos com a incitação até a que se promovam agressões físicas.
Ao longo de anos – e sempre em meio a um enfrentamento político agudo – jamais, deliberadamente, apelou-se para este tipo de comportamento.
Nem se foi cúmplice deles.
Porque este tipo de atitude só leva ao que temos hoje: a entronização da estupidez e do arbítrio como forma de exercer o poder.
O que está em curso, neste momento, é a aniquilação do Supremo Tribunal Federal e, como ocorreu ao longo dos últimos anos, com a cumplicidade de ministros do STF que usaram e abusaram deste expediente para obter visibilidade e prevalecer, na corte, com “o clamor das ruas”.
Luiz Nassif, em ótimo artigo no GGN, mostra que, infelizmente, não é só brasileiro o fenômeno, mas mundial, com o uso do sistema judicial – juízes e promotores – como forma de implantação de governos (ou pressões sobre governos) de sentido autoritário e ultracapitalistas.
Diz ele, no fecho do texto “O século do Judiciário e a volta da barbárie”:
País sem tradição democrática, o Brasil comprometeu a própria democracia, tendo como episódios trágicos o impeachment e a prisão política de Lula. O plantio pertinaz das sementes do arbítrio não foram praticadas por jovens procuradores concurseiros, mas por Ministros do STF, como Joaquim Barbosa, Ayres Brito, Carmen Lúcia, o indizível Luis Roberto Barroso, de Procuradores Gerais, como Antonio Fernando de Souza, Roberto Gurgel, Rodrigo Janot, todos encantados com seus novos poderes, e sem um pingo de responsabilidade em relação à Constituição, às leis, ao país. E, principalmente, devido à cegueira generalizada da mídia, só percebendo o monstro que criara quando de suas entranhas nasceu essa figura pública disforme de nome Jair Bolsonaro.
O século do Judiciário gerou a maior ameaça à democracia desde a ascensão do nazismo. A lógica é a mesma: a legitimação dada pelo clamor das turbas, derrubando leis, Constituição, calando os críticos, exterminando as oposições e impondo o populismo penal, sem freios nem contrapesos. E com procuradores se comportando como milícias vingadoras, sem estarem submetidos a nenhuma forma de freio.
Hoje o Brasil está mergulhado em uma luta entre corporações, com o caos institucional se espalhando por todos os poros do Estado.
Foi esta selvageria judicial que estimulou e insuflou a selvageria que, hoje, se volta contra as instituições judiciais.
Isso não tem nada a ver com liberdade de imprensa e é falso que seja este hoje o problema em questão neste caso do grupo que está sendo proibido de veicular ataques a Dias Toffoli.
O que ocorre, de fato, é a tentativa, canhestra e mal articulada, de enfrentar uma ofensiva fascista e autoritária que não se satisfez em dirigir o STF, mas quer aniquilá-lo.
Mas o que fazer contra um sistema que faz da especulação financeira o seu financiador e é instrumentalizado pelo Ministério Público como ferramenta de provocação e desafio à Corte Suprema?

Crise ajuda Guedes na privatização da Petrobras

Paulo Guedes prepara-se para aplicar o ditado chinês de transformar “crise em oportunidade”. Num sentido inverso do que os chineses o aplicam, claro: a crise é para o país, a oportunidade é para o dinheiro.
Disse ontem, na Globonews, que Jair Bolsonaro, diante dos discursos em favor da  privatização da Petrobras, “levantou a sobrancelha”:
“O presidente levantou a sobrancelha… Ué, se o preço de petróleo sobe no mundo todo inteiro e não tem nenhum caminhoneiro parando no Trump, na Merkel ou na porta do Macron, será que tem um problema aqui?”, disse.
O presidente, no dia seguinte, teria mandado uma imagem para Guedes em que mostrava 60 bandeiras de empresas no setor de petróleo nos EUA e apenas uma bandeira, a da Petrobras, no Brasil. “Acho que ele quis dizer alguma coisa com isso”, explicou.
Se quis ou não, agora quer, porque Guedes abriu a questão.
Aliás, nem é verdade que só exista uma bandeira no setor de petróleo no Brasil. Desde 1997 não existe aqui monopólio estatal no petróleo. Ninguém é impedido de extrair ou de refinar óleo, desde que esteja disposto a investir e pagar os tributos e participações correspondentes.
A sobrancelha levantada é o sinal para Guedes aprofundar o que desde sempre é seu plano: vender o filé das operações da Petrobras – a sua rede de comercialização, via BR istribuidora, e entregar, na bacia das almas, o investimento mais pesado da empresa – se tomado em valor dos ativos – que é seu parque de refino.
E como fazer isso sem despertar a fúria do brasileiro? Seguindo a toada fácil de transformar a empresa em inimiga do país, com os preços que cobra.
Ou melhor, com os preços que aparenta cobrar, porque é a tributação que faz o valor pago nas bombas. Tanto é assim que o combustível menos tributado – o diesel – custa, agora, R$ 2,24 na refinaria e R$ 3,55 no posto e a gasolina, que sai da refinaria a R$ 1,94, chega às bombas por R$ 4,40.
E que não se fale que há monopólio na distribuição, porque nunca houve, nem mesmo nos tempos do “petróleo é nosso”.
Não há crise, como se vê, há oportunidade de negócios.

Previdência: o governo não tem bala na agulha

Os analistas ainda não se debruçaram com profundidade sobre o que significa o aconteceu hoje no adiamento da Comissão de Constituição e Justiça  da Câmara, quando se adiou, à espera de um acordo, a votação da admissibilidade da PEC da Previdência.
O governo, mesmo contando com a adesão da parte “aderente” do “Centrão” – inclusive Rodrigo Maia – não chega aos votos suficientes para fazer maioria.
Não apenas isso: não tem articulação, capacidade política e nem ao menos humildade em procurar composições que lhe possam dar a maioria.
Quando o “Centrão” anunciou, duas semanas atrás, que havia pontos inaceitáveis na reforma, não foi negociar sua exclusão e preferiu dizer – e a aceitar a pantomima da aceitação – de que tudo seria negociado na comissão de mérito, não entendeu que a concordância era hipócrita e que não haveria vantagem alguma em ceder, na CCJ, tudo por nada.
Da mesma forma que a sessão de sorrisos e apertos de mão no Planalto, feita na volta de Bolsonaro de Israel não mudou em nada a relação – ou a falta de relação – com o governo.
Agora, o governo está contra a parede em ceder em outros quatro pontos que vão além daqueles que, antes, estavam condenados.
É só o início.
Daqui a quinze ou 20 dias, quando a comissão que analisará a proposta, isso se sucederá e as exigências serão maiores.
Dê-se por feliz a equipe econômica se sobrar algo como um terço do trilhão que Paulo Guedes imaginava retirar do sistema previdenciário. Talvez um pouco mais, mas numa velocidade muito menor que a pretendida, porque as ferozes regras de transição vão cair a patamares muito menos draconianos que os propostos.
E que outro naco será tirado pelo aumento real do mínimo, pauta saborosa que, até 17 de julho, terá de ser votada.
E, daí, mais algum no Senado, no segundo semestre.

sábado, 13 de abril de 2019

O mercado exige vassalagem completa

Política de preços não é orgia de preços.
A culpa de Bolsonaro neste caso da suspensão do reajuste do diesel pela Petrobras é, essencialmente, a de ter um governo que pensa que seu dever é atender ao “mercado”, não à população.
Para eles é “Deus-Mercado” acima de tudo e é a este “deus”, apenas neste, que seu governo encarrega de gerir a economia do País.
Nenhum dirigente responsável da Petrobras pode deixar de perceber o impacto que um aumento cavalar – 5,7%, numa quinzena – no diesel representa para o processo econômico, com  inflação em alta, e para o político, em meio a reiteradas ameaças de paralisação dos caminhoneiros.
É assunto que tem de ser discutido no Ministério das Minas e Energia, no da Economia e, neste grau de impacto, com o Presidente da República. Até porque, ao menos até agora, o “dono” da empresa é o Brasil e o governo seu gerente.
Foi por não acontecer isso (ou ter acontecido até o nível ministerial, não o presidencial) que teve de ocorrer a cena  constrangedora do anuncia-e-desanuncia o aumento.
E por isso, aí sim, Jair Bolsonaro é monstruosamente responsável, com as suas repetidas declarações de que as questões econômicas eram lá com o “Posto Ipiranga” de Paulo Guedes.
Agora, das duas, uma: ou vai ter gente de alto coturno pedindo o boné ou vai se ensaiar um balé hipócrita, com Bolsonaro, para não perder seus avalistas de mercado, aceitando uma pantomima de parcelar em dois ou três aumentos a “cacetada” que se daria de uma vez só.
Aos que gostam de fazer apostas, convém lembrar o que tem sido a prática: entre o equilíbrio e o “ficar com os seus”, o “Mito” tem preferido a segunda hipótese.
Não há nenhuma sutileza nas carretas bolsonaristas…