sábado, 27 de agosto de 2016

HOSPÍCIO...

Editorial do Le Monde: ou é golpe ou é, no mínimo, uma farsa

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Traduzido pelo UOL, o editorial de ontem do jornal francês Le Monde:
Se esse não é um golpe de Estado, é no mínimo uma farsa. E as verdadeiras vítimas dessa tragicomédia política infelizmente são os brasileiros.”
Dilma Rousseff, a primeira presidente mulher do Brasil, está vivendo seus últimos dias no comando do Estado. Praticamente não há mais dúvidas sobre o resultado do julgamento de sua destituição, iniciado na quinta-feira (25) no Senado. A menos que aconteça uma reviravolta, a sucessora do adorado presidente Lula (2003-2010), que foi afastada do cargo em maio, será tirada definitivamente do poder no dia 30 ou 31 de agosto.
Dilma Rousseff cometeu erros políticos, econômicos e estratégicos. Mas sua expulsão, motivada por peripécias contábeis às quais ela recorreu bem como muitos outros presidentes, não ficará para a posteridade como um episódio glorioso da jovem democracia brasileira.
Para descrever o processo em andamento, seus partidários dizem que esse foi um “crime perfeito”. O impeachment, previsto pela Constituição brasileira, tem toda a roupagem da legitimidade. De fato, ninguém veio tirar Dilma Rousseff, reeleita em 2014, usando baionetas. A própria ex-guerrilheira usou de todos os recursos legais para se defender, em vão.
Impopular e desajeitada, Dilma Rousseff acredita estar sendo vítima de um “golpe de Estado” fomentado por seus adversários, pela mídia, e em especial pela rede Globo de televisão, que atende a uma elite econômica preocupada em preservar seus interesses supostamente ameaçados pela sede de igualitarismo de seu partido, o Partido dos Trabalhadores (PT).
Essa guerra de poder aconteceu tendo como pano de fundo uma revolta social. Após os “anos felizes” de prosperidade econômica, de avanços sociais e de recuo da pobreza durante os dois mandatos de Lula, em 2013 veio o tempo das reivindicações da população. O acesso ao consumo, a organização da Copa do Mundo e das Olimpíadas não conseguiam mais satisfazer o “povo”, que queria mais do que “pão e circo”. Ele queria escolas, hospitais e uma polícia confiável.
O escândalo de corrupção em grande escala ligado ao grupo petroleiro Petrobras foi a gota d’água para um país maltratado por uma crise econômica sem precedentes. Profundamente angustiados, parte dos brasileiros fizeram do juiz Sérgio Moro, encarregado da operação “Lava Jato”, seu herói, e da presidente sua inimiga número um.
A ironia quis que a corrupção fizesse milhões de brasileiros saírem para as ruas nos últimos meses, mas que não fosse ela a causa da queda de Dilma Rousseff. Pior: os próprios arquitetos de sua derrocada não são santos.
O homem que deu início ao processo de impeachment, Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, é acusado de corrupção e de lavagem de dinheiro. A presidente do Brasil está sendo julgada por um Senado que tem um terço de seus representantes, segundo o site Congresso em Foco, como alvos de processos criminais. Ela será substituída por seu vice-presidente, Michel Temer, embora este seja considerado inelegível durante oito anos por ter ultrapassado o limite permitido de doações de campanha.
O braço direito de Temer, Romero Jucá, ex-ministro do Planejamento do governo interino, foi desmascarado em maio por uma escuta telefônica feita em março na qual ele defendia explicitamente uma “mudança de governo” para barrar a operação “Lava Jato”.
Se esse não é um golpe de Estado, é no mínimo uma farsa. E as verdadeiras vítimas dessa tragicomédia política infelizmente são os brasileiros.

ENQUANTO ISSO, NO SENADO FEDERAL...

Lula, exclusivo, ao Tijolaço: “Gilmar pôs o dedo na ferida”


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“Gilmar Mendes pôs o dedo na ferida”. O lead, obrigatório, da conversa que me permitiu, hoje, o ex-presidente Lula, precisa ser este, pelo imbróglio que se formou no enfrentamento entre o ministro do STF e a Procuradoria Geral da República pelo caso do vazamento da delação (ou ex-delação, se depender de Rodrigo Janot) do empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, seria este.
Mas vou me permitir seguir a ordem em que a conversa ocorreu, porque acho que importante, aqui, é o fato de deixar falar, e com o clima com que fala, um personagem da história brasileira – a recente, que ocorre neste instante e a que viveremos nos próximos tempos.
E ela começa assim que Lula sai do saguão do hotel, no Rio, para onde militantes, candidatos e repórteres se aglomeraram para ouvi-lo e desce as escadas para a garagem, em passo acelerado para um homem que completa 71 anos em menos de dois meses. Antes que lhe pergunte qualquer coisa, pergunta-me ele sobre os últimos tempos de Leonel Brizola, que ele, recém-empossado presidente e com as rusgas da política, não pudera acompanhar.
Dá a impressão de alívio ao saber que Brizola só se foi após os 82.
A primeira resposta vem já no carro, como um ensaio do que diria, daí a meia hora, no caminhão de som estacionado diante do Estaleiro Mauá, na Ponta da Areia, em Niterói, num ato em defesa do emprego que resta aos operários da indústria naval, náufragos ainda vivos da crise que afogou mais de 80% dos postos de trabalho. Era, afinal, o dia em que se iniciava o julgamento de Dilma Rousseff no Senado.
– Hoje é o dia da vergonha nacional, o dia em que os golpistas pensam que estão cassando Dilma Rousseff, mas cassam o eleitor, cada um deles que acordou, saiu de casa e votou para Presidente da República.
A energia das palavras, por um instante, dá lugar a um momento de perplexidade com a cassação política de um governante eleito.
-Desde a volta das eleições diretas, jamais imaginei que isso aconteceria. Não posso entender que alguém possa ser cassado por razões de uma possível perda de popularidade. Se fosse assim, todo governante seria cassado em algum momento de seu mandato.
Mas dura pouco a perplexidade com a onda de ódio político que está envolvendo o julgamento de Dilma. Logo chama para si a questão.
– Eu pensei que só tivessem tamanho ódio por mim, não por ela. Mas começaram tentando nos afastar, nos intrigar, desde o início do primeiro mandato. Quando viram que não conseguiriam, resolveram destruí-la e se aproveitaram de sua situação de fragilidade no campo da economia.
Que ele atribui, diretamente, às manobras de Eduardo Cunha.
–  Quando os Estados Unidos tiveram a crise, o presidente da Câmara, lá, ajudava a construir saídas. Aqui, além da mídia, ainda tínhamos um presidente da Câmara que trabalhava diariamente para impedir que Dilma fizesse os ajustes na economia e todo dia vinha com aquelas pautas-bomba.
A tolerância com Cunha, de olho no impedimento de Dilma, foi, para Lula, a razão para a degradação do clima político que atingiu seu ápice com a sessão deprimente da Câmara que autorizou a abertura do processo de impeachment, da qual fala com olhos arregalados, como se – como tantos – ainda não pudesse acreditar que tivesse ocorrido aquele episódio.
A mídia não lhe escapa e conta a opinião de Mário Soares, ex-primeiro-ministro e presidente de Portugal que, trabalhando como entrevistador para um programa de televisão de seu país veio entrevistá-lo há alguns anos, trazendo jornais do mundo inteiro sobre os sucessos do Brasil e lhe perguntou como, nos daqui, retratava-se “um Brasil que acabou”.
– A mídia construiu o discurso para a derrubada de Dilma e levou àquela cena…
Um telefone lhe é passado e interrompe seu raciocínio. São as conversas de que Lula não desiste para mover o que parece inamovível no voto dos senadores que votarão o impeachment. A esperança que escasseia é proporcional ao esforço que ainda faz, desmentindo as intrigas de que deixa Dilma à própria sorte e na conversa com um deles fica claro que ambos agem em sintonia.
Dá para perceber, em poucos minutos de conversa, o papel que ele teria desempenhado na Casa Civil, se Gilmar Mendes não tivesse impedido que ele a ocupasse. A história poderia ser outra, mas é esta que vivemos e me aventuro em tocar no nome do algoz de sua última tentativa de restabelecer a estabilidade política do governo eleito, citando a polêmica que está nos jornais, ressalvando que compreenderia que não entrasse num assunto em que ele, Lula, está sujeito a vinditas judiciais.
Não há nenhuma hesitação ou pedido de off:
– Gilmar Mendes tocou o dedo na ferida. Há dois anos, numa cerimônia em homenagem ao Márcio Thomas Bastos no Ministério da Justiça eu já protestava contra estes métodos. Quando [Sérgio]  Moro definiu [ele se refere às entrevistas do juiz citando a Operação Mãos Limpas, na Itália] que a imprensa ajudava no processo, ele estimulou o julgamento pela imprensa. É preciso que o juiz volte a julgar com os autos, as provas.
Para ele, o episódio pode servir para que se abra um debate sobre isso, agora que o vazamento atinge um ministro do Supremo Tribunal Federal e gera comoção. Lula não se verga ao conveniente e diz que é preciso que alguns juízes e membros do Ministério Público – “alguns, não todos’, ressalva – deixem de se comportar como ungidos por Deus para, a seu modo, definirem quem merece ou não ter direitos.
–  Sou vítima de mentiras há muitos anos. Sei o que é isso. Não posso aceitar que uma pessoa vá para o julgamento na Justiça já condenado pelo julgamento da mídia. E nem que os indivíduos, como alguns fazem, se comportem como se eles próprios fossem as instituições.
Agora é a visão dos barcos que servem à Petrobras fundeados na Baía da Guanabara que interrompe o assunto. Explico que eram muitos mais há algum tempo e, há mais tempo, antes dele, quase nenhum, quando só sucatas ficavam ancoradas no fundo da baía, a espera de desmonte, como ferro-velho. E os navios inconclusos, parados diante do Estaleiro Mauá, onde os operários sobreviventes o esperavam.
E a pergunta inevitável é sobre a perspectiva de retomada daquela indústria, que foi para o Rio, nos anos 60 e 70, como foi para São Paulo a indústria automobilística. Haverá, consumado o impeachment, a enxurrada de capital estrangeiro que, dizem, inundará o país?
–  Só virão comprar o que já existe. Comprar ativos, bens públicos. Acabar com a partilha [do petróleo do pré-sal]. Não se importam com a indústria nacional. Por que é que, em 2009, eu tive aquela briga com o Roger Agnelli, que Deus o tenha? Porque é que a Vale tinha de ir fazer lá fora aqueles navios de 400 mil toneladas [de porte bruto] que muito porto nem tinha calado para receber?
Já estamos na Ponta da Areia, passando no meio de um mar de gente que esperava Lula. Ele fica indócil, quer saltar do carro – “há quatro meses quero vir aqui” – e é desestimulado: “espera, presidente, espera a gente entrar [no portão do estaleiro], que de lá a gente vai para o carro de som”. Ele ainda insiste duas vezes, mas se conforma, sabe que está sendo cuidado.
Mas assim que entramos, sai do carro como um furacão e brilhando mais que sua guayabera branca, ergue os braços e sai pelo portão que o devia proteger daqueles que, de verdade, o protegem e acolhem.
Acabou minha meia hora. Lula agora está em seu meio. Volto a pé, ouvindo os comentários de admiração. Tomo um táxi, já uns 500 metros à frente. O taxista tem um irmão que era caldeireiro num dos estaleiros, irmão que agora está desempregado.
Fiz bem em levar o casaco desbotado que vesti para enfrentar o frio da manhã, quando saí para o encontro com Lula. Pertencia a Brizola e, como ele esqueceu numa produtora de vídeo onde foi fazer uma gravação e eu, assumidamente, não devolvi. Foi uma forma de levar Brizola ao lugar onde, creio eu, ele estaria.

Petróleo de Carcará: o crime é ainda maior do que parecia

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Quando este blog disse que a venda do campo de Carcará, no pré-sal petrolífero da Bacia de Santos era um enorme crime contra o Brasil, do tamanho do rombo provocado pelos assaltantes da Lava Jato, cometeu uma imprecisão ao dizer apenas que ele poderia ser maior, bem maior, do que a vizinha acumulação de Sapinhoá, segunda maior área de produção brasileira.
Carcará, nos cálculos que estimara seu reservatório de 1,3 bilhão de barris de óleo recuperável (passível de ser extraído), ao preço de R$ 8,5 bilhões, metade a vista e metade condicionada à absorção de áreas vizinhas, e se afirmou aqui que ele poderia ter mais do que Sapinhoá, estimado em 2,1 bilhões de barris recuperáveis.
Na CartaCapital desta semana, o geólogo Luciano Seixas Chagas, coordenador do grupo de assuntos de petróleo da Federação Brasileira de Geólogos diz que o total de reservas de Carcará pode chegar a até 6 bilhões de barris recuperáveis.
E que, pelas condições de porosidade da rocha, de ligação entre as acumulações e pela dissolução de gás no óleo (que resulta em elevada pressão e, portanto, alta vazão), em condições que barateiam e aceleram sua capacidade de produção.
Porque exige menos poços de produção e injeção, estes são mais simples, baratos e rápidos de perfurar e, depois, de interligar.
Características assim, no campo de Lula, fizeram a Petrobras baixar a previsão de poços necessários para produção plena de cerca de mil para pouco mais de 150 perfurações.
Como cada poço custa dezenas de milhões de dólares, é fácil imaginar o que isso resulta em relação custo/rendimento.
Infelizmente, este prejuízo imenso é, ainda assim,  muito pequeno diante do que o pa´si vai perder com a criminosa abolição do regime de partilha pretendida – e quase implantada – pelo governo golpista.
Veja, no vídeo abaixo, em linguagem muito clara e simples, o que isso vai representar.

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República de Curitiba peita Janot e Gilmar e vaza mais da “delação que não existe” da OAS

vejapeita
A República de Curitiba tomou o freio nos dentes, como se diz dos cavalos que já não obedecem às rédeas.
A capa da Veja que vai às bancas é um desafio aberto ao Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, e ao Ministro Gilmar Mendes.
Deram uma no cravo – açulando o indiciamento de Lula pela Polícia Federal – e desceram o malho na ferradura: o comando (se é que se pode ainda chamar assim)  da PGR e sobre Gilmar Mendes, que havia se insurgido contra o vazamento de uma insinuação infamante contra o também Ministro do STF Dias Tóffoli.
Desta vez não foi um vazamento, foi uma enxurrada de lama, uma espécie de estouro da barragem da Samarco, atirando lama sobre Lula, Dilma, mas também Aécio e Serra.
Janot disse publicamente que “nunca entraram” na Procuradoria os “anexos” da delação que a revista – ainda não tenho o texto – anuncia aos magotes em sua capa.
Popularmente, “jogaram no ventilador”.
Não “toparam” a amenizada de Gilmar, desde ontem.
E, de novo, a Veja é o veículo que mais se presta a publicar, com escândalo, o que lhes serve politicamente.
Quando se tiver acesso ao conteúdo, a partir do que ocorreu na edição anterior, é provável que se veja que muito – ou tudo, como na semana passada – sejam alegações sem prova.
Suposição que o “jornalismo” da revista há muito justifica.
Vai ficando completamente evidente que a Força Tarefa  joga no caos, quem sabe esperando que dos escombros da República surja “A lenda” para reinar sobre as ruínas.
Deixo à criativa imaginação do leitor imaginar quem seja.

O ódio transformou o Senado em Câmara e Renan em Delcídio. Assista

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Como no dia em que Joaquim Barbosa disse a Gilmar Mendes que ele não estava falando “com seus capangas lá do Mato Grosso” no plenário do Supremo Tribunal Federal, a sessão do  Senado Federal tem de ser suspensa.
Só pode continuar por muita falta de vergonha, depois do episódio provocado, no microfone do plenário, pelo senador Renan Calheiros, dizendo que Gleisi Hoffman não poderia falar que a Casa “não tinha moral” para julgar a presidenta Dilma Rousseff, porque ele, ” o presidente do Senado Federal conseguiu no Supremo Tribunal Federal desfazer o seu indiciamento e do seu esposo, que havia sido feito pela Polícia Federal.”
Gleisi nega, mas ainda que seja verdade, é a confissão pública que Renan pressionou indevidamente o Supremo e que este aceitou a pressão e interferiu indevidamente num inquérito.
Confissão feita diante do presidente do STF, que presidia a sessão.
O que fez Renan só se diferencia daquilo que levou Delcídio do Amaral à prisão pro ser mais explícito e feito em público e diante de Lewandowski.
Gleisi dizer que o Senado não tem moral para julgar Dilma é uma opinião. Pode-se discordar dela, embora o fato de diversos senadores – o próprio Renan, Romero Jucá, Aécio Neves e Aloysio Nunes, para ficar com os “graúdos” estão sendo investigados pelo recebimento de vantagens, delatados – a maioria – mais de uma vez.
Já o que fez Renan é a confissão de um fato e um fato criminoso.
Como todos são mesmo imorais, vão continuar, fingindo que Renan não disse nada e prometendo todos serem bons meninos e meninas, para que o julgamento ande rápido e não atrapalhe a viagem de Michel Temer ao exterior.
Se o Senado não tinha moral para julgar a Presidenta da República, certamente agora não tem, quando dentro dele, diante das câmaras de TV e do presidente do STF se confessa um crime e nada acontece, a não ser servirem um copo d’água com açúcar a Renan Calheiros.

O JUIZ NADA IMPARCIAL CHAMADO MORO...

Temer prepara o “Pro-Oi”, com R$ 5 bi do BNDES

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Quase na surdina, o Governo Temer acertou ontem um programa de endereço certo.
R$ 5 bilhões em créditos do BNDES para financiar a compra de empresas em recuperação judicial.
Leia-se a operadora Oi, para começar.
Amanhã, talvez, alguma empreiteira atingida pela Lava Jato.
Vende, reestrutura e os espertos levam o dinheiro.
Que se dane que o BNDES seja um banco de fomento e este negócio não fomente nada, exceto o lucro de empresários semifalidos.
O tsunami de dinheiro externo que viria, agora que Temer, o salvador da pátria, está a dias de se confirmar no golpe, não veio.
Na Folha, o economista José Roberto Afonso, da FGV, diz que “pelo visto, o mercado não deu conta (de financiar a compra das semifalidas). E esperava-se que estrangeiros entrassem e comprassem as empresas brasileiras em má situação financeira, mas também não devem estar dando conta.”
R$ 5 bilhões, num país carente de recursos para investimentos, para negócios que não vão gerar um emprego a mais, uma obra a mais, uma empresa a mais.
Não é sequer comprar um pedaço delas, recuperar e vender, com lucro, como os EUA fizeram com a GM, na crise de 2008/2009.
É financiar o negócio privado com dinheiro do Tesouro, sem receber nada em troca por isso, já que os juros são subsidiados.

Laura Carvalho e a “retomada”.É apenas cavar mais lentamente o buraco da economia

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Laura Carvalho, com seus artigos na Folha, tem sido uma das economistas mais lúcidas e claras ao analisar o que acontece no cenário da economia brasileira.
Em sua coluna de hoje ela explica com muito mais clareza do que eu tenho conseguido fazer que não há nenhuma recuperação da economia em curso, nem mesmo no horizonte visível, sequer.
A economia brasileira encolheu 3,8% em 2015, e as previsões são de que encolha esse ano mais 3,3%. Interpretar esta leve queda no ritmo da retração como um sinal claro de retomada da economia pode ser produto de “wishful thinking” ou má-fé.
O que acontece, diz ela, é que o Brasil está “cavando mais devagar” o buraco da crise, que depressa se cavou no período genial do “corta tudo que aí tem jeito” de Joaquim Onde Anda Você Levy.
À contração no total de despesas efetivas primárias federais —descontando as chamadas despedaladas— da ordem de 2,5% reais e de mais de 30% nos investimentos públicos, somaram-se uma aceleração inflacionária provocada pelo reajuste brusco nos preços administrados e sucessivas elevações nas taxas de juros.
Isso sem contar os efeitos deletérios dos discursos proferidos não apenas pela grande mídia, mas também pelo próprio governo, que, ao vender-se como uma grande família em crise, só contribuiu para abalar ainda mais a confiança de famílias brasileiras realmente vulneráveis.
Como se não bastassem os malefícios da própria política econômica, o país ainda teve de absorver no ano passado —assim como a maior parte dos países emergentes exportadores de commodities— os impactos negativos no curto prazo de uma desvalorização cambial.
Impactos esses que foram agravados pelo endividamento em dólar de boa parte das empresas brasileiras nos anos de expansão da economia. E para completar, ainda tivemos de lidar com a Lava Jato, a seca e a má vontade do Congresso.
Laura deixa claro, portanto, que o receituário anticrise do neoliberalismo, que a pressão midiática levou o governo a aceitar, aplicado nas doses cavalares que foi, só agravou a crise ao ponto em que ela chegou e do qual, agora, ainda passa, ainda que mais lentamente, ao menos por enquanto.
Cavar o poço mais devagar que em 2015 não parece, portanto, ser uma tarefa muito difícil. Sem a pressão dos analistas e com a súbita tolerância dos parlamentares, uma previsão de deficit maior garantirá que haja crescimento real das despesas primárias efetivas superior a 2%.
Onde, portanto, a retomada,exceto nas páginas de jornal – e já não com tanta frequência e sem a quase unanimidade?
Infelizmente, cavar menos o poço não significa que sairemos dele em breve. Em meio aos seus tantos sinais contraditórios –expansão fiscal fisiológica no curto prazo e promessa de contração fiscal perpétua a partir de 2019, por exemplo–, os primeiros cem dias de governo Temer foram inequívocos em ao menos um aspecto: a total ausência de agenda para a recuperação dos níveis pré-crise de emprego, renda e desigualdade.
A que temos – ou melhor, a que se promete no pós impeachment – aponta em sentido exatamente inverso.

Toledo e as pesquisas municipais. Só dá “Fora Temer”, de Norte a Sul

toledoibope
“Pulei” a oportunidade de comentar as pesquisas de intenção de voto para prefeito das capitais, divulgadas anteontem e ontem, por terem pouca relevância do ponto de vista do quadro nacional. São eleições despolitizadas e desmobilizadas como poucas vezes vi em minha vida e, ainda por cima, ao menos no Rio e em São Paulo por candidatos de pouca densidade política, Celso Russomano e Marcelo Crivella, exceto pelo fato de ambos terem mostrado uma enorme capacidade de se desfazerem ao longo da campanha.
O mais interessante nelas, feito ontem pelo colega Fernando Molica no Rio de Janeiro, é analisado nacionalmente hoje pelo ótimo José Roberto de Toledo: qual é o quadro da avaliação de Michel Temer nas principais cidades do país.
E o quadro é tão devastador que Toledo “mata a charada” da ausência do presidente interino dos palanques municipais.  Mais fácil que ser excesso de relo com sua base, é ser falta  de convite, mesmo porque espanta votos.

Temer longe da urna

José Roberto de Toledo, no Estadão
Às vésperas de perder o “interino” de seu título, e em tempo de estrear na política internacional em viagem à China, Michel Temer deve manter-se longe da política local – dos palanques, ao menos. O presidente em exercício anunciou que não fará campanha nas eleições municipais. Foi uma decisão esperta. A julgar pelos resultados das pesquisas Ibope em 22 grandes e médias cidades divulgados esta semana, seria, sim, por falta de convite.
Temer tem saldo negativo de popularidade em 22 das 22 cidades pesquisadas. Em todos elas, as taxas de ótimo e bom atribuídas ao seu governo são menores do que as taxas de ruim e péssimo. O tamanho do buraco varia de município para município, de região para região, mas, sem exceção, mais eleitores desaprovam a gestão Temer do que a elogiam. Logo, sua presença em palanques teria mais chance de atrapalhar do que ajudar um candidato.
É improvável que essa impopularidade onipresente mude em tempo de transformar o futuro ex-interino em um cabo eleitoral para candidatos a prefeito. Seria necessária uma reversão relâmpago da recessão e uma melhoria instantânea das expectativas econômicas para que Temer deixasse de ser um peso na urna.
Mesmo nas metrópoles onde seu partido, o PMDB, tem candidato com chances eleitorais palpáveis, Temer deve manter-se longe de comícios e propagandas na TV ou no rádio. Não apenas porque eventualmente assim prefira, mas porque os marqueteiros teriam um enfarte se precisassem inserilo ao lado do cliente.
Tome-se o caso de São Paulo. Marta, que não quer mais ser chamada de Suplicy, é a candidata peemedebista. Largou em segundo lugar, com 17% das intenções de voto estimuladas no Ibope. Tem boas chances de ir ao 2.º turno. Mas o endosso explícito de Temer não ajudaria em nada essa missão: 41% dos paulistanos acham o governo do interino ruim ou péssimo.
Na verdade, Temer tem uma taxa de ótimo e bom entre os paulistanos tão baixa quanto a do impopular prefeito petista Fernando Haddad: 13%. O saldo de popularidade presidencial em São Paulo é de 28 pontos negativos. E está longe de ser a cidade onde o presidente interino é mais mal avaliado.
No Rio de Janeiro, onde Eduardo Paes (PMDB) pena para eleger o candidato Pedro Paulo (tem 6% de intenção de voto e está em quarto lugar), Temer tampouco ajudaria. Sua popularidade está 30 pontos no vermelho. Ou seja, 25 pontos pior do que a de Paes.
Do Nordeste, então, Temer deve manter mais distância ainda. Em Salvador, ACM Neto (DEM) nada em popularidade. Tem 71% de ótimo e bom. Se a eleição fosse hoje, ele se reelegeria já no 1.º turno com 81% dos votos válidos. Para que arriscar um apoio explícito de Temer, que tem 53% de ruim e péssimo na cidade?
Em Feira de Santana (BA) a situação é igual: o candidato do DEM se reelegeria no 1.º turno e Temer amarga 50% de ruim e péssimo contra 10% de ótimo e bom. A maré de impopularidade presidencial também vai alta em outras cidades nordestinas.
No Recife, o presidente interino tem 48% de desaprovação. São 49% de ruim e péssimo em Teresina, 45% em Aracaju, 44% em Natal, 49% em Fortaleza e 46% em Maceió. Na capital de Alagoas, o governador, filho de Renan Calheiros, é mais popular do que Temer: 32% de ótimo/bom e 25% de ruim/péssimo: saldo de 7.
O fenômeno se repete em outras regiões. Em Belo Horizonte, Temer tem 47% de ruim e péssimo contra apenas 13% de ótimo e bom. Em Porto Alegre, onde o PMDB tem candidato a prefeito, Temer só não é mais impopular do que o governador peemedebista José Ivo Sartori. Tem saldo negativo de 32% contra 43% do governador. O cenário se repete no interior paulista, em cidades como Campinas, Ribeirão Preto, São Carlos, Araraquara e Sorocaba. Lá, Temer é mais mal avaliado do que Geraldo Alckmin (PSDB).
Para sorte do presidente, não há eleição municipal em Brasília.