Para entender o imbróglio do FIES

O mais novo pepino do governo Dilma - a crise do FIES (Fundo de Financiamento Estudantil) - começou no ano passado.
A intenção do FIES é permitir que os alunos de escola pública tenham acesso ao ensino superior, mesmo objetivo do REUNI (Reestruturação e Expansão das Universidades Federais).
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Foram dois programas históricos, montados após longos debates, que abriram o ensino superior para uma legião de alunos de baixa renda.
Nos últimos dois anos do primeiro governo Dilma, o fechamento da gestão à qualquer demanda externa impediu que o MEC (Ministério da Educação) identificasse a tempo as distorções que apareceram no programa.
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Por problemas com impostos, grande parte das escolas não tinha como acessar o FIES. Dilma lançou um programa, então, que permitia que quitassem as dívidas com as bolsas do FIES em um prazo de 15 anos. Havia a obrigatoriedade de quitar 10% no primeiro ano, nenhuma exigência para o ritmo de amortização nos 14 anos seguintes.
O governo lançava certificado, a escola pagava uma parte com impostos e outra parte dos certificados governo comprava. Mas quem estabelecia o preço da mensalidade era a própria escola, em lugar de ser o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
Já os alunos têm 18 meses de carência após a formatura, e o dobro do prazo do curso para quitar o financiamento. O valor é pré-fixado. Pagam-se os juros do período, limitados a R$ 50,00 por trimestre e a prestação não é corrigida.
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Aí começaram a aparecer as primeiras distorções.
Grande parte das faculdades embute um fator de risco nas suas mensalidades. O caso mais notório foi da UNIESP, alvo de uma CPI. Sua mensalidade era de R$ 1.000,00. Mas o aluno que pagava em dia, tinha um desconto de 80%, pagando apenas R$ 200,00. Com o FIES, a escola passou a cobrar R$ 1.000,00, sem risco, porque garantido pelo Tesouro.
Matrículas promocionais, descontos, tudo foi deixado de lado e as escolas passaram a oferecer ao FIES o chamado preço de vitrine. Mais que isso, as faculdades estimularam os alunos – mesmo os que podiam pagar – a aderir ao FIES. Em 2014 houve aumento de 7% no número de matrículas no curso superior e 480% no número de alunos pelo FIES.
Todos os alunos da UNIESP passaram a ser do FIES. O curso de pedagogia cobra mensalidades de R$ 1.200,00, mesmo o campus sendo em Guaianazes, região pobre de São Paulo.
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Em 2013 as faculdades passaram a correr para o FIES. Em 2014, houve o estouro da boiada, uma bolha no mercado de ações. Grandes gestores – como Pátria e BTG – entraram no jogo. Só o Kroton, um dos grandes grupos do mercado, recebeu $ 1 bilhão do FIES, um terço do seu faturamento.
Houve uma corrida à compra de faculdades, que tinham seus preços fixados pelo número de alunos, com enorme aumento da concentração do setor. Para aumentar o faturamento e o valor de venda, faculdades passaram a aceitar alunos se, formação, alguns sequer alfabetizados. A UNIESP tinha convênio com uma igreja que recebia 10% da mensalidade de cada aluno encaminhado.
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Quando se deu conta do problema, o governo Dilma agiu com o mesmo voluntarismo: suspendeu todo o programa de uma vez. As faculdades deixaram de intermediar as matrículas e os alunos ficaram na mão.
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O caminho natural seria o MEC – ou a Casa Civil – convidar todos os personagens para uma reunião – associações de escolas, federações de professores, ONGS etc. – para buscar uma soluções consensual.
Mas seria pedir muito.